
28 de agosto de 2019 | 06h00
HONG KONG – Perguntem à Liga Anti-Difamação, organização judaica dos Estados Unidos que combate o racismo e a intolerância, e ela dirá que Pepe, o Sapo, é um símbolo de ódio – líder de torcida do racismo e do antissemitismo, amigo dos radicais da direita alternativa. O sapo verde, tristonho, é universalmente considerado uma figura nociva, sinal de uma visão de mundo sinistra e perigosa.
Por isso, talvez, seja um tanto chocante ver Pepe em seu novo papel: o de um defensor da liberdade em favor da democracia nos protestos de Hong Kong. Aqui, os manifestantes levantam cartazes com a sua imagem, usam adesivos que o retratam em aplicativos de mensagens e fóruns de discussão, e até mesmo pintam o seu rosto com tinta spray nos muros.
Acaso isto significa que os revoltados de Hong Kong pertencem à direita alternativa ou racista? A pergunta confunde muitos manifestantes, que não têm a menor ideia de quais sejam as conotações do sapo em outras partes do mundo. Eles só gostam da figura. “Não tem nada a ver com a ideologia estatal de extrema direita”, escreveu alguém no LIHKG, um fórum anônimo que está no centro das discussões dos manifestantes. “Ele é só uma figura engraçada e conquista os corações de muitos jovens”.
Mari Law, um manifestante de 33 anos, sabe como Pepe é visto em outros lugares, mas disse que isto não tem importância porque, em Hong Kong, Pepe não tem a mesma fama. A maioria dos manifestantes desconhece a sua associação com a direita alternativa. “Para mim, Pepe é apenas um personagem parecido com Hello Kitty”, comparou.
Poucos demonstraram, online, ter consciência do lado sinistro do sapo. Não tem havido muitas discussões sobre o simbolismo que ele carrega, e nas poucas ocasiões em que isto foi destacado, a única manifestação que recebeu foi um sinal de menosprezo. Para os manifestantes, é apenas alguém como eles.
Um adesivo para aplicativos de mensagens como Telegram e WhatsApp retrata Pepe com o capacete amarelo que é a assinatura dos manifestantes, envolto em gás lacrimogênio ou levantando cartazes contra o governo. Ele também se transformou em um trabalhador de primeiros socorros e em um jornalista. Pepe nem sempre foi um símbolo racista. Ele foi oi criado há mais de dez anos por Matt Furie, que matou o personagem em 2017, depois que foi adotado pela direita alternativa.
Membros desta facção apropriaram-se da sua imagem para grande consternação de Furie. Ele disse que o sapo, perpetuamente "chapado", deveria ser positivo, e denunciava qualquer ligação com grupos racistas ou marginais. “É totalmente insano que Pepe tenha sido rotulado como um símbolo de ódio, e que racistas e antissemitas utilizem um personagem originalmente pacífico da minha revista de quadrinhos como um ícone ruim”, lamentou o autor em 2016, quando a Liga Antidifamação acrescentou Pepe à lista dos símbolos de ódio. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
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