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Profissionais de saúde correm para vacinar população contra febre amarela

Doença que já matou 237 pessoas no Brasil, desde o início do verão, agora atinge metrópoles

Por Shasta Darlington e Donald G. McNeil Jr.
Atualização:

SÃO PAULO - “Bom dia!”, berrava em uma dessas manhãs um alto-falante no bairro Jardim Monte Alegre, na periferia de São Paulo. “Recebemos a sua vacina contra a febre amarela, e hoje estamos indo de casa em casa! É melhor você acordar porque os mosquitos não dormem!”

Vinte funcionários da saúde pública saíram dos carros, rindo e conversando com moradores enquanto começavam a desempenhar sua missão vital. 

A enfermeira Núbia Cavalcante ministrou a vacina contra a febre amarela no bairro de Pirituba, em São Paulo Foto: Dado Galdieri para The New York Times

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O Brasil está enfrentando seu pior surto de febre amarela após muitas décadas. O vírus, que mata de 3% a 8% das pessoas infectadas, agora ronda grandes metrópoles como Rio de Janeiro e São Paulo, e ameaça provocar a primeira grande epidemia urbana do país desde 1942.

Embora tenham ocorrido apenas 237 mortes desde o início do verão, a taxa de mortalidade explodirá se o vírus chegar até as favelas e às nuvens de Aedes aegypti que vivem ali.

O A. aegypti é também o causador da zika, dengue e chikungunya.

No início de 2016, o vírus da febre amarela abandonou o seu padrão normal: uma difusão limitada pelos mosquitos da floresta desde os macacos aos operários de madeireiras, caçadores, agricultores e outros habitantes da bacia do Amazonas. O vírus começou a dispersar-se em direção ao sul e ao leste, seguindo os corredores da floresta habitados pelos macacos rumo às grandes cidades da orla e desencadeando uma emergência de saúde pública.

Tomados pelo pânico, brasileiros começaram a atirar, a espancar até a morte e envenenar macacos, acreditando que isto deteria o avanço da doença. Na realidade, afirmaram as autoridades, istoprejudicou os esforços para detectar o vírus, porque as mortes dos macacos são usadas como um indicador de sua direção.

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No ano passado, as cidades praticamente não foram atingidas - os casos foram diminuindo até julho, com a chegada do inverno. As autoridades de saúde global ficaram aliviadas, na esperança de que campanhas de vacinação intensa acabariam com o surto.

Mas não foi o que aconteceu, disse o dr. Sylvain Aldighieri, diretor do Programa de Emergências da Organização Pan-Americana da Saúde.

“Existe uma transmissão confirmada pelos laboratórios durante o inverno”, ele afirmou. “Foi por isso que a quantidade do vírus existente no início do verão já era grande”.

O vírus ressurgente agora viaja quase dois quilômetros por dia, segundo o especialista, e os esforços para deter a epidemia se tornaram uma corrida entre o vírus e os vacinadores.

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O número de casos deste ano é 26% superior ao mesmo período no ano passado, e com os meses mais quentes e mais chuvosos, este número deverá aumentar.

Este ano, a febre amarela - assim chamada porque os olhos das pessoas infectadas adquirem uma cor amarelada, assim como a pele, o seu sintoma mais comum - começou a matar turistas estrangeiros, inclusive visitantes da Ilha Grande, um paraíso turístico ao sul do Rio de Janeiro. Dois cidadãos chilenos e um suíço caíram vitimas, e visitantes da França, Holanda e Romênia ficaram gravemente doentes.

O Brasil produz sua própria vacina e grande parte do caos que se instalou este ano poderia ter sido evitado se o governo tivesse agido com maior presteza, afirmam os críticos. Ocorre que os baixos preços do petróleo afetaram todos os setores da economia. Além disso, o país passa por uma série de crises políticas que contribuíram para distrair a atenção das autoridades.

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Profissionais de saúde estão indo de casa em casa para vacinar a população Foto: Dado Galdieri para The New York Times

“O sistema de saúde pública brasileira demorou demais para agir”, segundo a dra. Karin A. Nielsen, especialista em moléstias infecciosas na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, que faz pesquisa no Brasil. “Os macacos estavam morrendo no mato há dois ou três anos”.

O dr. Renato Vieira Alvez, o coordenador de doenças transmissíveis do Ministério da Saúde, discordou. “As campanhas de vacinação não podem ser lançadas de uma hora para a outra”, ele disse. “Estes novos casos estão ocorrendo em sua maioria em áreas em que, até agora, nós não recomendávamos a imunização”, acrescentou.

O esforço para vacinar 23 milhões de pessoas se reduziu porque falsos rumores começaram a correr a respeito da vacina.

“Quando as pessoas pararam de nos procurar, começamos a ir até elas”, disse Nancy Marçal Bastos, diretora de Saneamento e Saúde do norte de São Paulo. “As pessoas apresentam um monte de desculpas por não terem recebido a vacina ainda, mas quando nós aparecemos, em geral, é fácil convencê-las”.

Carregando caixas de isopor com gelo cheias de vacinas, os trabalhadores da saúde param no bar da esquina e no ginásio local, perguntando: “Quem ainda não foi vacinado? Façam uma fila!”

No outono, longas filas se formaram nos hospitais; em um único fim de semana foram distribuídas 85 mildoses. Então o movimento contra a vacina começou a espalhar boatos assustadores prejudicando a campanha.

Lúcia Helena de Paula, 36, explicou a sua preocupação: “Vi um vídeo no WhatsApp com uma moça que dizia que ficou paralítica depois de tomar a vacina”.

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Mas, depois das palavras tranquilizadoras de uma enfermeira, ela concordou em tomar a vacina.

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