Projeto educacional muda destino de meninas no Marrocos

O empreendimento social criado Maryam Montague está progredindo e pronto para chegar também a Uganda

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Por Marjorie Olster
Atualização:

DOUAR LAADAM, MARROCOS - Em uma pequena aldeia marroquina nos arredores de Marrakesh, dezenas de meninas adolescentes concluíram suas atividades pós-escolares gritando uma série de afirmações: "Eu sou forte! Eu sou inteligente! Eu sou capaz! Eu sou uma líder! Eu sou feminista!".

Esta é uma cena extraordinária neste país de maioria muçulmana, principalmente em Douar Laadam, uma aldeia pobre onde muitas meninas são obrigadas a deixar os estudos na puberdade para se casar e começar a procriar.

'Nenhum país poderá progredir se deixa para trás 50% de sua população, disse Maryam Montague. Foto: Natalie Keyssar para The New York Times

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Maryam Montague, uma ex-integrante da ajuda humanitária que se tornou dona de hotel e designer e se define como "empreendedora social", teve a ideia de dar a essas jovens a possibilidade de se manifestarem mediante um programa por ela criado, o Project Soar (Projeto Voar).

"Nenhum país poderá progredir se deixar para trás 50% de sua população", afirmou Maryam, uma americana expatriada cuja mãe nasceu no Irã. "Investir em uma adolescente equivale a investir em mais de 40 anos de futuro produtivo".

O Projeto Voar oferece às meninas apoio acadêmico, capacitação para um emprego, educação sobre saúde, esportes e aulas de artes. 

É gratuito, mas, para participar, as meninas devem prometer que permanecerão na escola. Maryam financia parte do projeto com os proventos de um hotel butique que ela e o marido construíram e uma verba dos Estados Unidos. Além disso, ela recebe financiamento da nova linha de roupa de Maryam, Agent Girlpower, uma pequena coleção que inclui conjuntos para a prática do esporte e lazer e joias com mensagens feministas inscritas em árabe e inglês.

Desde a implantação do programa, em 2013, o Projeto Voar, se expandiu para 21 lugares, e dele participam 475 meninas.

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Maryam adaptou o Projeto a um modelo dimensionável e reproduzível e disse que está fazendo progressos para a instalação da primeira filial fora de Marrocos, em Uganda.

A ideia inicial do Projeto era oferecer às adolescentes um incentivo para que permanecessem na escola a fim de poderem adiar o casamento e a gravidez. No Marrocos, segundo o Banco Mundial, a taxa de meninas matriculadas nas escolas cai para 24% depois da conclusão do ensino fundamental.

Em troca pelo compromisso de continuar os estudos, elas receberam acesso aos programas pós-escolares que, de outro modo, não existiriam no país.

Quando Maryam soube que menos da metade das meninas da região fora aprovada no exame de final do curso, exigido para o ingresso no ensino médio, o Projeto Voar acrescentou ao programa aulas de reforço. Este apoio aumentou a taxa de promoções para as meninas do Projeto para 73% em comparação com 44% das meninas da área de Marrakesh.

As mães das meninas eram, em sua maioria, adolescentes quando se casaram, e houve certa oposição ao projeto.

"Trata-se de um trabalho controvertido", afirmou Maryam. "Eu acho que ele representa uma revolução silenciosa, mas mesmo assim, uma revolução".

No Marrocos, como em muitos países em desenvolvimento, as meninas faltam às aulas quando chegam à puberdade porque não podem comprar produtos para seu período menstrual. O Projeto fornece kits para esta época e ensina as meninas a lidar com a menstruação.

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"Existe uma cultura da vergonha", disse Maryam.

Khadija Satour, 15, foi proibida pelo pai de participar do Projeto. Mas ela voltou a pedir sua autorização um ano mais tarde e ele cedeu, segundo informou uma administradora do programa, Wafaa Afkir. Quando Khadija chegou ao projeto, gaguejava e nunca falava de si mesma, segundo Wafaa. Agora, ela é comunicativa e se orgulha do que já realizou.

"Agora compreendo a mim mesma e me conheço melhor e isso permitiu que compreendesse melhor as outras pessoas", afirmou Khadija. "Conhecer a mim mesma foi a melhor conquista em minha jornada para alcançar minha autonomia", disse, tentando conter as lágrimas.

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