Se a recessão vier, bancos terão uma margem de manobra limitada

Juros reduzidos deixam pouco espaço para cortes. Em 2008, ano de grande crise, experimentação sem precedentes salvou algumas economias

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Por Jeanna Smialek , Jack Ewing e Bem Dooley
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Os banqueiros centrais não se cansam de repetir: "Conserte o telhado enquanto o sol brilhar". Mas dez anos depois de a Reserva Federal dos Estados Unidos ter colaborado com o Banco Central Europeu e o Banco do Japão para afastar a economia global da beira do abismo, sua capacidade de impedir a próxima crise é limitada.

Em 2008, os bancos centrais cortaram os juros, compraram títulos, aumentaram o apoio do governo a produtos financeiros, emprestaram dinheiro a bancos e, em alguns casos, fizeram um trabalho coordenado com as autoridades do governo para garantir que os pacotes de ajuda não fossem usados para propósitos opostos. Foi um período de experimentação sem precedentes que salvou algumas economias.

Christine Lagarde, atual chefe do Fundo Monetário Internacional, aconselha bancos a unirem esforços com urgência a fim de afastar o perigo de uma recessão. Foto: Gorka Sampedro

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Hoje, os juros permanecem abaixo de zero no Japão e na Europa. Nos Estados Unidos, os juros são baixos de acordo com os padrões históricos, o que nos deixa com menos espaço para cortes em uma eventual crise. A maioria dos bancos centrais ainda detém grandes volumes de títulos e outros papéis adquiridos para sustentar as suas economias da última vez, o que poderia dificultar um novo frenesi de compras.

A política monetária também está com a credibilidade em baixa. Importantes bancos centrais não conseguiram atingir suas metas inflacionárias de 2%, elevando o risco de uma queda perigosa dos preços no caso de uma nova crise. E embora as promessas de uma redução dos juros mais duradoura tenham constituído um importante estímulo nos últimos anos, estas promessas poderão perder parte da sua força.

Autoridades dos bancos centrais insistem que estão preparadas para agir caso surjam sinais de outra recessão. O Banco Central Europeu está de prontidão para estimular a zona do euro, e o Federal Reserve assinala que prevê o corte dos juros nos EUA. Mas economistas do mundo inteiro afirmam que os bancos centrais não podem mais ser os únicos salvadores. Esta realidade colide com as restrições políticas dos Estados Unidos e da Europa, onde os legisladores poderão se mostrar incapazes - ou sem vontade política - para oferecer pacotes de estímulo.

Christine Lagarde, que foi indicada para suceder a Mario Draghi à frente do Banco Central Europeu e atualmente chefia o Fundo Monetário Internacional, advertiu que os bancos centrais provavelmente serão a principal linha de defesa, dadas as restrições fiscais. “O elevado endividamento público e os juros baixos deixaram muitos países com um espaço de manobra limitado”, explicou Lagarde. E acrescentou que as nações terão de usar ao mesmo tempo seus instrumentos econômicos, com “um decisivo afrouxamento monetário e o estímulo fiscal, sempre que possível”.

Em 2018, estava ocorrendo uma expansão internacional coordenada. Mas as guerras comerciais dos Estados Unidos, a ameaça da retirada britânica da União Europeia e uma persistente crise na China constituem novos riscos para a atividade internacional. Tais fatores levaram Draghi a assinalar em junho que o banco central planejava reeditar medidas de estímulo que utilizara durante a crise da dívida na zona do euro. Embora Draghi insista que o banco ainda tem “um espaço considerável” para comprar títulos como uma maneira de bombear dinheiro na economia, alguns analistas acreditam que ele agiu de maneira preventiva porque sabe que a capacidade do banco é finita.

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O Japão oferece um exemplo de cautela por considerar que a vontade de agir não garante o sucesso. Haruhiko Kuroda, diretor do Banco do Japão, cortou os juros entrando em território negativo, e comprou títulos da dívida do governo e ações para ajudar os mercados e aumentar a confiança.

Apesar de todo o esforço, a inflação continua abaixo da meta do Japão. Não se sabe ao certo que espaço Kuroda teria para agir em uma crise, segundo Makoto Hara, autor do livro sobre o banco central japonês. “Estas medidastabu tornaram-se normais”, afirmou.

Os líderes do banco central advertiram que seu poder de fogo será limitado sem a ajuda das autoridades fiscais. “A política monetária continuará cumprindo a sua tarefa independentemente do que acontecer com a capacidade fiscal”, disse Draghi, dias depois que os líderes europeus não conseguiram criar um mecanismo capaz de fornecer um estímulo conjunto. Entretanto, a ajuda dos governos “realizaria a mesma função mais rapidamente e com menos efeitos colaterais”. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

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