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'Star Trek' tenta reconquistar o universo

'Picard' mostra um capitão mais velho enfrentando o próprio passado

Por Dave Itzkoff
Atualização:

SANTA CLARITA, CALIFÓRNIA - Michael Chabon costumava trabalhar escrevendo romances. Mas, em junho do ano passado, ele estava correndo pelos sets de filmagem de Star Trek: Picard, série da qual é produtor executivo.

Chabon, 56 anos, ganhador do prêmio Pulitzer, mostrou os dois polegares para o astro de Picard, Patrick Stewart, que ensaiava uma cena do outro lado da sala.

A partir da esquerda, Evan Evagora, Alison Pill e Patrick Stewart em “Star Trek: Picard", a mais recente série de uma franquia que já dura mais de 50 anos. Foto: Trae Patton/CBS

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O que atraiu Chabon para a série Star Trek [Jornada nas Estrelas] enquanto fã na adolescência e o manteve interessado enquanto produtor é, de acordo com ele, uma mensagem subjacente que mostra um futuro esperançoso para a humanidade, dentro do razoável.

“A série não diz que os seres humanos são basicamente maravilhosos e, se ao menos aprendêssemos a concordar uns com os outros, todos os nossos problemas acabariam", disse ele. “É necessário trabalhar para isso. É um esforço.”

O mesmo vale para as tentativas de manter viva um venerável universo da ficção científica como Star Trek. Aquilo que começou em 1966 como um seriado de baixa audiência deu origem a uma vibrante e dedicada comunidade de fãs, múltiplos programas de TV e uma série de filmes.

Star Trek tenta também redescobrir seu lugar em um universo que, na prática, a própria série inventou. Foi graças a ela que esse gênero conquistou o grande público, e seus produtores aprenderam a dar ouvidos aos fãs quanto à direção que o programa deveria seguir. Mas a franquia acabou eclipsada por seus sucessores, desde antigos rivais como o universo Star Wars [Guerra nas Estrelas] até concorrentes mais recentes como os filmes da Marvel, e briga hoje para se manter relevante.

Uma nova era de narrativas serializadas e conteúdo oferecido via streaming proporcionou a Star Trek essa oportunidade. No dia 23 de janeiro, o primeiro episódio de Picard, série que visita novamente o intrépido capitão da Frota Estelar de Star Trek: The Next Generation [Jornada nas Estelas: a nova geração], será lançado no serviço de streaming CBS All Access, da emissora de mesmo nome. Na plataforma, o seriado se junta a Star Trek: Discovery, cuja terceira temporada estreia ainda este ano. Há pelo menos três outras séries novas em fase de produção.

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Patrick Stewart teve de ser convencido a reprisar o papel de Jean-Luc Picard. Foto: Mark Sommerfeld para The New York Times

Mas, em uma época em que as franquias de entretenimento se tornaram o principal ganha-pão dos conglomerados de mídia, Star Trek resiste, mesmo não sendo o mais chamativo ou moderno desses universos fictícios. E os responsáveis pela propriedade intelectual acreditam que a série ainda tem muito a oferecer, com poder de permanência e potencial para mais crescimento, se eles se mantiverem fiéis a seus valores idiossincráticos.

Alex Kurtzman, 46 anos, supervisiona os muitos novos seriados do universo Star Trek na TV. Ele é também roteirista e produtor dos dois primeiros filmes da nova série Star Trek que recomeçou em 2009.

Alguns anos atrás, Kurtzman foi procurado pela CBS para ajudar na criação de uma nova série da franquia para a TV.

Discovery, criada por Kurtzman e Bryan Fuller, tem como foco uma oficial da Frota Estelar interpretada por Sonequa Martin-Green, e as primeiras aventuras da trama precedem em alguns anos a série Star Trek original.

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Picard é o próximo programa a testar a longevidade da marca Star Trek.

A última aparição de Stewart nas telas como Jean-Luc Picard ocorreu em 2002 no filme Nemesis. Desde então, ele recusou todas as propostas de retornar ao papel.

Apesar da relutância de Stewart, os produtores o procuraram há cerca de dois anos com uma ideia. Eles começaram a pensar em uma história situada muitos anos após os dias de glória de Picard. Um mistério na vida dele o faria procurar antigos aliados e inimigos, ao mesmo tempo obrigando-o a confrontar as circunstâncias que o fizeram abandonar a Frota Estelar. Quando a conversa chegou ao fim, Stewart, 79 anos, se disse intrigado.

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Desde o início da série, há mais de meio século, as empresas de mídia passaram a depender mais das franquias. Os filmes da Marvel, que renderam bilhões de dólares em todo o mundo, servem como modelo de sucesso: o plano é criar um universo de material de fantasia ou ficção científica, a partir do qual diferentes personagens podem coexistir e se misturar nas histórias.

Star Trek ajudou a colocar em movimento essa dinâmica cultural e financeira muitos anos atrás, mas seus rivais a deixaram para trás. Até Star Wars está aprendendo a estender seu alcance para as plataformas de streaming com séries como The Mandalorian, disponível no Disney Plus.

Para Chabon, o prazer de trabalhar com Star Trek está na tensão entre honrar a complexa história interna e, ao mesmo tempo, inovar e expandir a trama. “Podemos deixar a imaginação correr solta, mas, ao mesmo tempo, precisamos garantir que tudo se encaixe nas histórias já existentes sem perder a consistência e a coerência", disse ele.

Sonequa mostrou confiança na ideia de que sempre haverá um lugar para as parábolas criativas que a série ajudou a introduzir.

“Há poucas coisas no mundo como a ficção científica, capazes de mudar paradigmas e as crenças das pessoas", disse ela, “e isso me faz amar esse gênero. São circunstâncias fantásticas que permitem às pessoas um acesso fácil a tais temas. Todos se envolvem. É uma delícia". / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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