PUBLICIDADE

Um símbolo da cooperação entre americanos e soviéticos

Além de comida enlatada e motocicletas Harley-Davidson, os aviões modelo Douglas evidenciam o elo entre EUA e URSS

Por Andrew E. Kramer
Atualização:

MOSCOU - Para os soviéticos da época da 2.ª Guerra Mundial, os aviões americanos modelo Douglas se tornaram símbolos da cooperação entre o seu país e os Estados Unidos, como a comida enlatada e as motocicletas Harley-Davidson. Durante a guerra, os EUA enviaram 705 aviões de transporte Douglas à URSS sob o acordo Lend-Lease. Alguns foram abatidos ou sofreram acidente, outros foram devolvidos aos EUA após a guerra, e alguns continuaram em uso na União Soviética por anos.

PUBLICIDADE

Apenas um deles continua na Rússia até hoje, de acordo com um historiador do acordo Lend-Lease, preservado pelo destino: o C-47 de motor duplo fez um pouso de emergência em um trecho da tundra do Ártico tão remoto que, por quase 70 anos, ninguém se ocupou de recuperá-lo. As relações entre EUA e Rússia estão em baixa atualmente. Ainda assim, um grupo fortemente ligado ao Kremlin planeja restaurar e expor a aeronave como peça central de um novo museu - um lembrete de uma época em que as duas potências trabalhavam juntas.

Pouco se fala na Rússia a respeito do Lend-Lease, o programa americano que enviou milhões de toneladas de ajuda - caminhões, jipes, motocicletas, aviões, tanques, combustível e alimento - para a União Soviética e outros aliados. “Quando as relações são boas, falamos a respeito disso", disse o historiador Vyacheslav V. Filippov. E, quando os elos entre americanos e russos se deterioram, “todos parecem esquecer".

Um avião C-47 de fabricação americana, parte do programa Lend-Lease, fez um pouso de emergência na Sibéria em 1947. Um grupo russo planeja colocá-lo em exposição. Foto: Acervo de Vyacheslav V. Filippov, via Sociedade Russa de Geografia

O caso do Douglas se tornou uma exceção. A Sociedade Russa de Geografia está patrocinando o seu restauro para a exposição em um museu de Krasnoyarsk, cidade siberiana cerca de 2.200 quilômetros ao sul de onde o avião permaneceu por sete décadas. Ao menos em parte, a atenção emana de um episódio ocorrido sem nenhuma relação com a cooperação em tempo de guerra. O exemplar sobrevivente do C-47 é uma relíquia daquela que já foi uma tragédia famosa do extremo norte russo.

Em seu último voo, em 1947, um motor e o rádio pararam de funcionar durante a viagem pela Sibéria. O piloto, Maksim D. Tyurikov, pousou o avião na paisagem gelada quase sem danificá-lo. Ele então usou um lápis para escrever do lado de dentro da fuselagem que tinha salvo os passageiros, embora não pudesse salvar a si próprio. Ele morreu tentando buscar ajuda no vilarejo mais próximo, a mais de 160 quilômetros dali. 

Havia um total de 26 ou 32 pessoas a bordo, de acordo com diferentes fontes. Seis passageiros e dois tripulantes morreram caminhando em busca de ajuda, enquanto aqueles que se refugiaram no avião sobreviveram por 19 dias até a ajuda chegar, em parte ao dividir os mantimentos de emergência de comida enlatada americana na aeronave.

Por sete décadas, o Douglas permaneceu ali. Perdeu-se na memória popular, tornando-se pouco mais que uma curiosidade pouco conhecida - um monumento à amizade entre superpotências visto apenas pelo ocasional pastor de renas. Agora, a sociedade de geografia diz que o avião ficará em exposição para celebrar tanto a ajuda americana oferecida pelo Lend-Lease quanto o heroísmo dos pilotos soviéticos. “Como as pessoas, os países podem discutir e depois fazer as pazes", afirmou Aleksandr V. Matveyev, um dos engenheiros restaurando o avião. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.