PUBLICIDADE

Irã anuncia autossuficiência na produção de combustível nuclear

Declaração foi feita às vésperas da primeira negociação entre Teerã e o Ocidente, na segunda-feira, 6, em Genebra, após um ano de impasses

Por Jamil Chade e GENEBRA
Atualização:

Na tentativa de dar um sinal de que não irá desistir de seu programa atômico, o Irã anunciou neste domingo, 5, que se tornou pela primeira vez autossuficiente na produção completa do ciclo do combustível nuclear, driblando as sanções da ONU. O país passou a utilizar urânio de uma mina local para a produção de combustível, um passo significativo em seu programa atômico e uma demonstração de que não ficará dependente de fornecimento de urânio do exterior.

 

PUBLICIDADE

A declaração foi feita às vésperas da primeira negociação entre Teerã e o Ocidente, na segunda-feira, 6, em Genebra, depois de mais de um ano de impasses. "Seja qual for o esforço que o Ocidente coloque em suas sanções, nossas atividades nucleares continuarão e verão grandes conquistas no futuro", disse o diretor do Organismo de Energia Atômica iraniano, Ali Akbar Salehi. "Vamos à negociação com força e poder", disse.

 

Na segunda, depois de 14 meses sem contatos, as potências do Conselho de Segurança da ONU, Alemanha e o Ira se sentarão à mesa para voltar a dialogar. O encontro em Genebra terá a presença apenas da União Europeia, que representará os demais parceiros que pressionam por uma solução ao polêmico programa nuclear iraniano. Mas a própria chefe da diplomacia da UE, Catherine Ashton, admitiu ontem que não se esperam resultados concretos da reunião que ocorre entre a segunda e a terça-feira, mas sim uma demonstração de um compromisso real de negociar e uma espécie de agendas com temas que poderão ser tratados.

 

Mas, se confirmada, a medida anunciada ontem ainda significaria que o Ira driblaria as quatro rodadas de sanções do Conselho de Segurança da ONU que impedem a importação do pó de oxido de urânio concentrado, conhecido como Yellow Cake, e considerado como fundamental para a geração do combustível nuclear.

 

Na prática, a dependência na importação do material estaria rompida, o que daria pela primeira vez autonomia para o funcionamento das usinas nucleares. "Isso significa que o Irã se tornou autossuficiente em no ciclo completo do combustível", afirmou Salehi. "A partir de agora, o Irã já não terá problemas no abastecimento de urânio", disse.

 

Em fevereiro, o governo já havia desafiado as organizações internacionais e a pressão do Conselho de Segurança, anunciando que daria inicio à produção de urânio enriquecido. No domingo, 5, Teerã indicou que, desde então, já produziu mais de 35 quilos de urânio enriquecido a 20%. A produção, porém, poderia quase dobrar se fosse necessário.

 

Agora, após ser processado em centrífugas, o pó tem a possibilidade de ser transformado em hexafluoreto de urânio (UF6), essencial no processo de enriquecimento e vital no eventual de desenvolvimento de armas atômicas, algo que o Ocidente teme que seja as reais intenções de Teera. O primeiro material teria sido produzido a partir das minas de Bander Abbas e a primeira utilização teria sido a usina de Isfahan.

Publicidade

 

Salehi ainda alertou que o anúncio era uma demonstração de que nada iria parar os iranianos em seu projeto atômico. O recado está também relacionado ao misterioso ataque contra dois cientistas nucleares no Ira, há uma semana. Um deles não sobreviveu e o Irã acusou a CIA pelo assassinato.

 

Isolamento - Para o Ocidente, a declaração não ocorre por acaso e sao mera "propaganda" para a populacao interna, cada vez mais desconfiada da lideranca. A avaliacao de diplomatas ocidentais é de que os comentários do Ira são uma forma de criar uma situacão que não condiz com a realidade. A avaliação do grupo é de que as sanções estão dando os primeiros resultados, afetando a economia do país e obrigando o Irã a sentar à mesa para negociar.

 

O Ocidente acusa Teerã de camuflar um projeto com dimensões militares, argumentando que o país tem apenas objetivos civis com o desenvolvimento da tecnologia nuclear. Por isso, vai querer a partir de hoje garantias da parte do Irã de que suas ambições são pacíficas. Essas garantias seriam seguidas por mecanismos concretos e do fim das atividades de enriquecimento de urânio.

 

Salehi mantém seu discurso desafiador e diz que a negociacão serve mais aos americanos e europeus que ao Irã.

 

Na sexta-feira, 3, a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, pediu que o Ira participe das negociações em Genebra em "boa fé" e com uma "avaliação real do que o isolamento significa". Há apenas uma semana, documentos revelados pelo grupo WikiLeaks indicaram como vários países àrabes estariam dispostos a apoiar um ataque contra Teerã, antes que obtenha a arma nuclear.

 

Mas Hillary ainda indicou que o Irã poderia enriquecer urânio no futuro, mas "uma vez que demonstrem que o podem fazer de forma responsável e de acordo com suas obrigações internacionais".

 

Saïd Jalili, negociador iraniano que lidera a delegação em Genebra, já afirmou no domingo mesmo que os direitos de Teerã de ter seu programa nuclear "não são negociáveis".

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.