BEIRUTE - A renúncia do primeiro-ministro libanês, Saad Hariri, se traduziu nesta quarta-feira, 30, num claro relaxamento da tensão, com o fim dos bloqueios das estradas, mas essa vitória dos manifestantes está longe de satisfazer suas reivindicações e abre um período de incerteza.
O presidente Michel Aun aceitou implicitamente essa renúncia e pediu "ao governo que continue a gestão dos assuntos correntes até a formação de um novo governo", de acordo com a Constituição.
Após duas semanas de mobilização sem precedentes no Líbano, todos os acessos à capital foram liberados, permitindo a retomada das atividades após uma longa paralisia.
O Exército reabriu a passagem de Jal al-Dib, ao norte da capital, onde a polícia se posicionou sob o olhar atento de algumas dezenas de manifestantes.
Os ativistas, que nesta manhã deitaram na ponte de Beirute para continuar bloqueando as vias, foram retirados sem violência algumas horas depois.
Com o desbloqueio de estradas, o Ministério da Educação anunciou a retomada a partir de quinta-feira das aulas. Os bancos deverão reabrir na sexta-feira após 12 dias do fechamento, de acordo com a Associação de Bancos do Líbano (ABL).
Ao anunciar na terça-feira sua renúncia, Hariri desencadeou cenas de júbilo em todo o Líbano, onde os manifestantes exigem desde 17 de outubro a saída de toda a classe política.
'Pressão vai continuar'
Sua renúncia, no entanto, parece não ser capaz de responder sozinha ao descontentamento contra políticos acusados de incompetência e corrupção em um país que carece de serviços públicos de qualidade.
Mohammed, um oficial do Exército na reserva, retornou nesta quarta à Praça dos Mártires, em Beirute. "Hariri tomou uma boa decisão renunciando, mas agora queremos eleições antecipadas e o retorno do dinheiro roubado", disse ele.
Para Charbel, de 26 anos, "essa renúncia não será suficiente para nos fazer sair das ruas, a pressão continuará".
A renúncia não era desejada por Aun nem por seu aliado Hezbollah, o único partido ainda armado no Líbano, cujo líder Hassan Nasrallah alertou para o risco de "caos".
Segundo a imprensa, Hariri poderia tentar montar uma nova equipe, formada principalmente por tecnocratas reconhecidos por sua competência, mas nesse caso enfrentaria resistência política.
Além disso, de acordo com a imprensa, Aun se recusa a "sacrificar" seu genro, ministro das Relações Exteriores Gebran Bassil, provavelmente o mais odiado pelos manifestantes que o consideram corrupto e "arrogante".
A situação é ainda mais complicada pelo sistema libanês, segundo o qual o cargo de primeiro-ministro deve ser ocupado por um sunita, sendo Hariri um dos poucos políticos de destaque nesta comunidade.
A revolta, no entanto, trouxe o nome do ministro do Interior, Raya al-Hassan, sunita de 52 anos cuja ação foi aclamada por causa da moderação e neutralidade da polícia./AFP