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Bombardeios se intensificam no Leste da Ucrânia, com mobilização militar total dos separatistas

Em meio ao aumento dos confrontos na região separatista, milhares foram retirados das províncias pró-Rússia de Donetsk e Luhansk, enquanto Putin comandava exercícios militares com mísseis balísticos e hipersônicos

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Por Redação
Atualização:

KIEV - Com bombardeios atingindo cidades nas regiões separatistas pró-Rússia no leste da Ucrânia no sábado, milhares de civis foram retirados em massa em ônibus enviados à cidades russas na fronteira, enquanto líderes separatistas apoiados pelo Kremlin convocaram uma mobilização militar total, citando a suposta ameaça de um ataque iminente de forças ucranianas —acusação que Kiev nega.

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Denis Pushilin, chefe da autoproclamada República Popular de Donetsk (RPD), disse que assinou o decreto da mobilização, convocando homens "capazes de empunhar uma arma" a se dirigir a quartéis militares. Leonid Pasechnik, chefe da República Popular de Luhansk (RPL), assinou um decreto similar posteriormente.

Em paralelo, o Exército da Ucrânia anunciou que dois soldados morreram e quatro ficaram feridos em ataques dos separatistas neste sábado, afirmando que as forças rebeldes estavam posicionando artilharia em áreas residenciais para tentar provocar uma resposta. Também relatou 70 incidentes armados na manhã deste sábado, depois de 66 nas 24 horas anteriores.

Soldado ucraniano inspeciona casa atingida por bombardeios no vilarejo de Krymske, na região separatistas de Luhansk, uma das mais atingidas da linha de frente Foto: AP Photo/Vadim Ghirda
Uma casa destruída por bombardeios na região separatista de Luhansk, onde milícias pró-Rússia entraram em confronto com soldados ucranianos Foto: AP Photo/Vadim Ghirda

Os separatistas abriram fogo em mais de 30 assentamentos ao longo do front usando artilharia pesada, que foram proibidas por acordos que têm o objetivo de distender o conflito de oito anos na região, disse o Exército ucraniano. No Telegram, oficiais separatistas acusaram a Ucrânia de atacar áreas sob o controle deles, afirmando que têm de responder à altura.

Além disso, a Rússia disse neste sábado que dois projéteis lançados da área no Leste da Ucrânia controlada por Kiev chegaram a seu território, sem deixar feridos. O ministro de Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, descreveu a declaração como "falsa".

O conflito começou quando os separatistas pró-Moscou tomaram controle de parte do território na região em 2014, mesmo ano em Moscou anexou a Península da Crimeia depois que protestos causaram a queda de um presidente pró-Rússia. Segundo Kiev, mais de 14 mil pessoas morreram no conflito no Leste do país desde então.

Soldado ucraniano fala com colega em uma trincheira na linha que separa o território dos separatistas pró-Rússia da Ucrânia, em Zolote Foto: AP Photo/Evgeniy Maloletka
Reservistas se reúnem em uma escola após convocação para mobilização militar de separatistas na cidade de Donetsk Foto: REUTERS/Alexander Ermochenko

Observadores da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), que monitoram o conflito desde 2014, anunciaram um "aumento drástico" nas violações do cessar-fogo. Os Acordos de Minsk, alcançados em 2014 para tentar reduzir o conflito no Leste da Ucrânia, não são cumpridos nem por Kiev nem Moscou.

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O fogo de artilharia aumentou ao longo de toda a linha de frente, disse o Ministério do Interior ucraniano no sábado, e teria "sw multiplicado" nos últimos três dias.

Várias barragens intensas de artilharia atingiram um bolsão de território controlado pelo governo ao redor da cidade de Svitlodarsk, um local que preocupa analistas de segurança há semanas por sua proximidade a infraestruturas industriais perigosas, incluindo tanques de armazenamento de gás venenoso.

Enquanto explosões eram ouvidas no norte da cidade de Donetsk, controlada pelos separatistas, mais pessoas embarcavam em ônibus para partir para a Rússia, disseram testemunhas à Reuters.

As autoridades separatistas dizem ter planos de retirar cerca de 700 mil pessoas — neste sábado, agências russas relataram que 10 mil já chegaram à Rússia.

‘É muito assustador. Peguei tudo que consegui carregar”, disse Tatyana, de 30 anos, que entrava em um ônibus com a filha de quatro anos.

Dezenas de pessoas tentam entrar em um trem para a Rússia na cidade de Debaltseve, território controlado por separatistas pró-Rússia Foto: AP Photo/Alexei Alexandrov
Ucraniano se despede da filha em retirada de civis para a Rússia na cidade de Donetsk Foto: Alexander Ermochenko/Reuters

"Tenho um bebê pequeno", disse Nadya Lapygina, moradora de Staryi Aidar, uma das várias dezenas de cidades atingidas por artilharia e morteiros na fronteira norte da região separatista de Luhansk. “Você não tem ideia de como é assustador escondê-lo do bombardeio.”

Há semanas os Estados Unidos alertam que uma série de ações de sabotagem e ataques falsos simulados por separatistas pró-Rússia poderiam acontecer e ser usados como pretexto para uma invasão russa. O presidente Biden declarou na sexta-feira que o presidente Vladimir Putin já havia decidido invadir a Ucrânia.

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Apelo da Ucrânia

Apesar dessa situação cada vez mais tensa no front, que custou a vida de dois soldados ucranianos neste sábado, o presidente Volodmir Zelenski viajou para a Alemanha para participar da Conferência de Segurança de Munique e receber apoio do Ocidente. Na reunião, ele exigiu um calendário "claro e factível" para a adesão de seu país à Otan e novas garantias de segurança. 

Alguns observadores em Washington expressaram preocupação de que sua saída do país neste momento crítico possa fornecer uma abertura para Moscou, que o Ocidente acredita ter a intenção de derrubar o governo de Zelensky.

O presidente ucraniano fez um apelo emocionado ao Ocidente, dizendo que as sanções contra a Rússia deveriam começar imediatamente e que não havia sentido em declarações diárias de que os ataques são iminentes, pois estão destruindo a economia do país. Ele acrescentou que nenhum acordo deve ser fechado com a Rússia que não inclua sua nação.

O presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, discursa à conferência de segurança de Munique, Alemanha, em 19 de fevereiro Foto: Ronald Wittek/EFE

“Esta é a maior crise de segurança desde o fim da Guerra Fria. Como deixamos chegar a esse ponto em pleno século XXI? Já vimos duas guerras mundiais, esperamos que não haja uma terceira", comentou o presidente ucraniano.

Zelenski também falou sobre a entrada da Ucrânia na Otan, que a Rússia vê como uma ameaça à sua fronteira e seria o principal motivo para a mobilização militar russa na fronteira ucraniana. “Se vocês não querem que façamos parte, ao menos sejam sinceros. Desde 2014 batemos à porta da Otan pedindo ajuda para nossa situação. Estamos nos tornando um escudo da Europa", disse Zelenski sobre as atividades militares que manifestantes pró-Russia e a própria Rússia realizam perto de suas fronteiras.

"A Europa precisa de uma nova arquitetura para lidar com essas crises. Queremos ações, não só palavras ou promessas. O que temos hoje é um xarope para tosse, sendo que temos uma vacina à disposição", completou o líder do governo ucraniano comparando a arquitetura que há hoje com a que poderia ser desenvolvida.

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Em Munique, a vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, alertou que se a Rússia invadisse a Ucrânia, os Estados Unidos e seus aliados teriam como alvo não apenas instituições financeiras e exportações de tecnologia para a Rússia, mas também “aqueles que são cúmplices e aqueles que ajudam e dirigem essa invasão não provocada”.

Exercícios militares

O presidente russo, Vladimir Putin, também enviou sua própria mensagem, presidindo os testes de mísseis com capacidade nuclear em exercícios militares realizados neste sábado.

As tensões entre os Estados Unidos e a Rússia não são tão altas desde a Guerra Fria, e os exercícios nucleares da Rússia no sábado pareciam cuidadosamente programados para impedir o Ocidente de envolvimento militar direto na Ucrânia. 

Kremlin informou que os exercícios estratégicos russos realizados neste sábado, 19, sob a supervisão de Vladimir Putin, em meio a uma crise com o Ocidente sobre a Ucrânia, envolveram disparos de mísseis balísticos e de cruzeiro, e também hipersônicos.  

Captura de vídeo divulgada pelo Ministério da Defesa da Rússia em 19 de fevereiro de 2022 mostra um míssil russo Iskander-K sendo lançado durante um exercício em um local indefinido na Rússia Foto: Russian Defence Ministry / AFP

"Os objetivos planejados durante os exercícios das forças estratégicas de dissuasão foram totalmente cumpridos. Todos os mísseis atingiram os alvos estabelecidos", informou a presidência russa em comunicado.

Esses mísseis, segundo o Kremlin, são capazes de transportar cargas nucleares. As agências de notícias russas RIA Novosti e Interfax disseram que os exercícios foram monitorados por Putin e pelo líder da BelarusAlexander Lukashenko, da sala de situação no Kremlin.

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Anunciados na sexta-feira, os exercícios militares em larga escala tiveram início horas depois de os Estados Unidos alertarem que estavam certos de uma invasão iminente da Ucrânia, onde os confrontos entre Kiev e separatistas pró-Rússia no leste estão aumentando.

Captura de vídeo divulgada pelo Ministério da Defesa da Rússia em 19 de fevereiro de 2022 mostra um míssil balístico intercontinental Yars sendo lançado durante um exercício de treinamento em um local indefinido na Rússia Foto: Russian Defence Ministry / AFP

Os exercícios deste sábado se seguem a uma série de manobras das Forças Armadas russas nos últimos quatro meses, que incluíram o posicionamento de soldados —estimados entre 150 mil e 190 mil — ao Norte, Leste e Sul da Ucrânia.

A Rússia ordenou a concentração militar enquanto reivindica que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) se comprometa a nunca permitir a entrada da Ucrânia na aliança, enquanto afirma que declarações de que planeja invadir a Ucrânia estão erradas e são perigosas.

Os exercícios militares estratégicos da Rússia mobilizaram forças do distrito militar do Sul, as forças aeroespaciais, as frotas do Norte e do Mar Negro, bem como "forças estratégicas", segundo o Kremlin.

Esses últimos estão equipados com mísseis de alcance intercontinental, bombardeiros estratégicos, submarinos, navios e aviação naval equipados com mísseis submarinos convencionais.Washington estima que a Rússia tenha 190 mil soldados nas fronteiras e território da Ucrânia, incluindo forças rebeldes separatistas. 

O Pentágono afirmou na sexta-feira que 40-50% das tropas russas estão "em posição de ataque" e que os incidentes na linha de frente são parte de "uma campanha para desestabilizar a Ucrânia" antes de uma invasão. 

A Rússia não divulgou o número de soldados destacados nas fronteiras com a Ucrânia ou em exercícios conjuntos com a Belarus./ W.POST, NYT, AP, AFP e REUTERS

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