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Escombros, crateras e tempestades: o perigoso esforço de resgate do desabamento em Miami

Número de mortos aumentou para 11 enquanto as equipes de busca e resgate continuavam a abrir caminho entre o aço pulverizado e as pedras de concreto

Por Patricia Mazzei , Richard Fausset e Christina Morales
Atualização:

SURFSIDE, Flórida - Na segunda-feira, no topo da sombria pilha de detritos e concreto quebrado, algumas das equipes de resgate mais especializadas do mundo cavavam túneis, muitas vezes com as mãos, na esperança de encontrar sinais de vida. À medida que a tarde avançava, parecia que suas esperanças seriam estilhaçadas por mais um dia. Mas, de quando em quando, os trabalhadores paravam, se abaixavam e coletavam o que equivalia a pequenos e frágeis prêmios de consolação: fotos pessoais dos moradores do Champlain Towers South, edifício que menos de uma semana atrás estava cheio de vida, com um típico conjunto de famílias, avós e aposentados do sul da Flórida. Segunda-feira foi o quinto dia de árduos esforços de busca e resgate, e a possibilidade de encontrar com vida qualquer uma das 150 pessoas que se acreditava desaparecidas diminuiu ainda mais. As fotos e alguns outros objetos pessoais que de alguma forma conseguiram sobreviver ao colapso eram um consolo.

Socorristas usam cães para encontrar sobreviventes nos escombros do edifício que desabou Foto: David Santiago/Miami Herald via AP

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“Não sobrou muito”, disse Maggie Castro, bombeira e paramédica do Miami-Dade Fire Rescue e especialista em resgate da Força-Tarefa 1 da Flórida, uma das equipes de busca e resgate de elite que vêm trabalhando na pilha de escombros desde sexta-feira. Castro disse que quase tudo dentro do prédio foi destruído quando uma parte significativa estremeceu e desabou na manhã de quinta-feira. “Encontramos algumas carteiras. Algumas joias. Identificamos porta-retratos maiores para devolver às pessoas”, disse ela. O esforço cuidadoso para preservar pelo menos alguns dos pertences das pessoas que viviam na torre é uma das muitas maneiras pelas quais os agentes de resgate estão reconhecendo que os desafios técnicos assustadores e às vezes angustiantes que enfrentam são apenas parte de seu trabalho. A partir de domingo, as autoridades começaram a escoltar as famílias dos desaparecidos ao local para ver de perto a resposta de emergência, com centenas de equipes de resgate.

Frustração das famílias

Algumas famílias ficaram frustradas e até irritadas com a lentidão do trabalho de resgate. Mas Castro disse esperar que a possibilidade de as famílias verem a magnitude do desastre possa ajudá-las a entender por que as coisas avançam com tanta lentidão – e quem sabe ajudá-las a processar uma realidade que ainda pode parecer um pesadelo. O trabalho no local está lento e sem boas notícias desde alguns resgates na quinta-feira. Em coletivas de imprensa na segunda-feira, as autoridades anunciaram que o número de mortos aumentou para 11.

Na busca por sobreviventes, equipes enfrentam muitos desafios Foto: David Santiago/Miami Herald via AP

“Uma coisa é ficar sentado num lugar, só imaginando o que está acontecendo, outra é ver tudo com seus próprios olhos”, disse ela. “Para algumas dessas pessoas, pode ser o mais próximo que chegarão de suas famílias”. As autoridades explicaram às famílias que colocar muitos resgatadores na pilha pode desmoronar as cavernas ocultas e dificultar ainda mais os esforços de resgate. As famílias também viram em primeira mão o perigo que as equipes de resgate enfrentam. No domingo, um trabalhador de busca e resgate rolou 8 metros monte abaixo, diante de alguns familiares de moradores. Enquanto agências de todos os níveis do governo chegavam a Surfside e começavam a delinear os contornos de uma investigação sobre o que dera errado, a secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, disse que o presidente Joe Biden apoiaria uma ampla investigação do desastre, abrangendo várias agências federais, entre elas a Administração de Segurança e Saúde Ocupacional e o FBI. “Certamente queremos desempenhar todo e qualquer papel construtivo que possamos desempenhar com recursos federais para ir fundo nesse caso e evitar que problemas semelhantes aconteçam no futuro”, disse Psaki aos repórteres na segunda-feira. O prefeito de Surfside, Charles W. Burkett, insistiu na segunda-feira que as autoridades investigariam os motivos do colapso, mas disse que era “um problema para outro dia”. Por enquanto, disse ele, as prioridades são a busca por sobreviventes e o apoio às famílias dos mortos e desaparecidos.

Membro da equipe de buscas procura por vítimas sob escombros Foto: Giorgio Viera/EFE

Complicações no resgate

Tempestades complicaram o esforço de resgate, e mais chuvas pesadas cobriram a pilha na segunda-feira. Quando desistiram, os curiosos e os enlutados saíram para ver os memoriais que surgiram nas cercas ao longo do local. A área ao redor do edifício parcialmente desabado deixou de ser um tranquilo idílio à beira-mar para se transformar em um lugar de luzes piscando e geradores zumbindo constantemente. Equipes de resgate pintaram os números dos andares do prédio em verde, com anotações em laranja indicando que as buscas foram concluídas no local. Na entrevista coletiva na manhã de segunda-feira, Ray Jadallah, chefe de operações do Miami-Dade Fire Rescue, foi inflexível ao dizer que as autoridades não haviam tomado a dura decisão de encerrar as operações de busca e resgate e se concentrar na descoberta de restos mortais. Ele também enfatizou a complexidade dos esforços. Não se tratava de levantar um andar após o outro para procurar sobreviventes, disse ele, mas de separar aço pulverizado e escavar entre pedras de concreto. Em outras áreas, as equipes de resgate encontraram “volumes maiores de concreto que agora exigem maquinário pesado”, um processo que revelou pelo menos um dos dois corpos na segunda-feira. As equipes estão usando câmeras para explorar os vazios que os socorristas não conseguiram alcançar. Em alguns casos, vêm seguindo sons fracos. Mas Jadallah advertiu que isso não era necessariamente uma prova de sobreviventes. “Pode ser uma torneira, pode ser alguma coisa se quebrando – pode não ser nada mais do que parte do metal que está se contorcendo”, disse ele. Mas todas as variáveis devem ser consideradas “antes de tomarmos a decisão de passar para a próxima fase”. O esforço mais amplo para limpar o local e identificar os restos mortais pode levar meses, com base em esforços semelhantes em edifícios desabados, de acordo com especialistas. No curto prazo, o uso de DNA fornecido pelos membros da família para identificar corpos leva cerca de 90 minutos. Mas o médico legista também precisa fornecer uma confirmação adicional dos restos mortais, processo que normalmente leva um dia. Embora o pessoal de emergência do sul da Flórida talvez tenha mais experiência em responder a furacões, eles também têm experiência em colapsos estruturais, disse Castro. “Mas nada dessa magnitude”, disse Castro. “Certamente não vimos o número de vítimas potenciais que veremos neste incidente em particular. É muito, muito triste”. / Tradução de Renato Prelorentzou.

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