LONDRES - O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, deu sinais na sexta-feira, 13, de que pretende ceder na questão da fronteira entre as duas Irlandas para aprovar um acordo para o Brexit.
Fontes do gabinete disseram ao jornal Financial Times que o premiê esboça um acordo com a União Europeia que inclua uma abertura comercial da fronteira entre Irlanda e Irlanda do Norte e a manutenção dos norte-irlandeses dentro de regras comerciais do bloco.
A tarefa não será fácil. O acordo teria de ser aprovado a toque de caixa pelo Parlamento britânico, que está em recesso após uma controvertida medida de Johnson, que sofreu seis derrotas seguidas no plenário na semana passada.
Além disso, o Partido Unionista da Irlanda do Norte (DUP), que faz parte da coalizão de Johnson, é radicalmente contra qualquer solução para o Brexit que mantenha o território unido à UE – o que, na prática, significa a reunificação da Irlanda.
O principal impasse para a aprovação de acordo para o Brexit, negociado pela ex-premiê Theresa May, é o chamado “backstop”, mecanismo que funciona como uma espécie de seguro que manteria a Irlanda do Norte nas regras alfandegárias da UE, caso não haja solução para o problema da fronteira entre as duas Irlandas.
Pelo Acordo de Sexta-Feira Santa, de 1998, que colocou fim ao confronto entre católicos e protestantes no território, não pode haver fronteira física entre as duas Irlandas. Mas, com o Brexit, o Reino Unido teria de restabelecer controles fronteiriços com a UE, já que a República da Irlanda é a única fronteira física entre o Reino Unido e o bloco. Assim, desde abril, quando May costurou o acordo com Bruxelas, a questão da Irlanda segue sem solução.
Diplomatas ainda mantêm cautela e dizem que há pontos importantes para serem resolvidos. O esboço é focado em alimentos e agricultura – o comércio de carne bovina e leite é especialmente suscetível a perturbações. Na sexta, Johnson disse estar “prudentemente otimista”. “Estamos trabalhando duro por um acordo”, afirmou.
Em Washington, a presidente da Câmara dos Deputados, Nancy Pelosi, alertou que os democratas no Congresso suspenderiam qualquer acordo comercial que o Reino Unido venha a assinar com o presidente Donald Trump se o Brexit comprometer o Acordo da Sexta-Feira Santa, um legado do ex-presidente Bill Clinton.
Johnson promoveu um acordo comercial com Washington como um dos incentivos para deixar a UE. Se a questão for barrada no Congresso americano, Johnson perderia um argumento forte para o Brexit.
A negociação entre Johnson e Bruxelas sobre a Irlanda do Norte pode também desferir o último golpe contra sua combalida coalizão e dar ao premiê a eleição antecipada que ele tanto defendeu nas últimas semanas. Se o DUP romper com os conservadores, em consequência de um acordo que mantenha a Irlanda do Norte alinhada à UE, Johnson teria de optar por um governo de minoria ou por novas eleições – o que, em tese, lhe favorece, já que o seu Partido Conservador lidera as pesquisas.
“É a única opção”, disse Thomas Wright, analista do Brookings Institution. “Isso pode não acontecer, mas oferece uma rampa de saída e é, basicamente, a única rampa de acesso oferecida.”
Negociação
Na segunda-feira, Johnson se reunirá pela primeira vez desde que assumiu o governo com o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, e com o negociador-chefe da UE, Michel Barnier. Ambos disseram na sexta que esperam “propostas concretas” do governo britânico.
Na quinta-feira, Barnier estava pessimista. Ele disse não existir motivos suficientes para o início de novas negociações sobre um acordo para o Brexit. Em conversas privadas, segundo líderes do Parlamento Europeu, Barnier disse que Johnson ainda não apresentou uma alternativa para resolver a situação da fronteira das Irlandas, que permanece sendo o ponto mais delicado de um possível acordo para o Brexit. / NYT e AFP